"Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer, amar e malamar,
amar, desamar, amar?" (CDA)Ontem, fui ao show de lançamento do songbook de Dori Caymmi. Ao ouvir duas de suas canções de amor na voz de Sergio Santos, cantor apaixonado, me vi apaixonada.
Naquele momento único, me apaixonei - perdidamente - pela voz, pela palavra, pela melodia e chorei.
Sentindo cada nota se transformando em lágrima, comecei a pensar em mim mesma. Na ausência de um amor companheiro, de um amor devotado, de um amor físico e espiritualmente identificado e sentido.
Tento entender o porquê. Foram as muitas noites e dias de leitura? Foram os museus e suas belezas infinitas, retratando os amores reais e fictícios? Foram os poemas que li, naquela quartinho dos fundos da casa da amiga, quando era uma adolescente? Foram os amigos de cabelos longos que conheci nos anos 70? Foram os desconhecidos que diziam coisas lindas, nos encontros inesperados, durante as caminhadas, as viagens, as salas de aula? Foram as canções, cantadas em inglês que nunca entendi de verdade? Foram as flores perfumadas, ao longo da ferrovia?
Onde aprendi que o amor é de uma tal maneira estonteante, que, definitivo, marca a vida e dá sentido a ela?
Todos temos de ter uma amor assim, como o cantado por Sergio Santos?
Então, minhas lágrimas foram de saudades do que não existiu. "Do que não tem conserto e nunca tera".
Já estou aqui, num momento da vida em que as coisas todas estão desenhadas pela realidade. Não tem poesia que a transforme.
Não amei, como nas minhas amadas canções.
Não encontrei o amor, como nos meus romances preferidos. Nem sofri como neles.
Não escreverei, ou beberei, ou arrancarei meus cabelos, como nos filmes italianos.
Não deixarei um livro de memórias, para que saibam como amei e fui amada.
Não receberei uma carta de amor.
Não rasgarei uma carta de amor.
Mas, continuo vivenciando espetáculos da arte, imaginados pelo amor. Dori Caymmi, Chico Cesar e Geraldo Azevedo, Matheus Natchergaele, Tchekhov e todos que vocês me veem comentando, compartilhando...
Ah, Drummond, "o que pode uma criatura"?
É isso, amigos! Hoje acordei, toda trabalhada na Emma Bovary.