"Cai cai balão
Cai cai balão
Na Rua do Sabão!
O que custou arranjar aquele balãozinho de papel!
Quem fez foi o filho da lavadeira.
Um que trabalha na composição do jornal e tosse muito."
Liguei para meu pai em Brasília e pedi uma ajuda. "Dá para falar com o Sr. Lins, pai da sua vizinha?" Deu. Fui primeiro a Brasília, fiquei uns dias com meu pai, depois fui a Recife. Arrumei também um jeito de ficar uns dias em Maceió. O Sr. Lins lembrava João Cabral de Melo Neto, magrinho, óculos, camisa branca de manga curta, calça social cinza velhinha. Eu chegava bem indicada pela filha - a vizinha de meu pai do conjunto habitacional dos funcionários da gráfica do Senado Federal. Gente boa, gostosa para conversar, acolhedores. Fiquei em um bairro, perto de um colégio judaico tradicional. A outra filha era professora lá. Foi a primeira vez que ouvi a palavra "morá" que achei tão linda. Era um apartamento pequeno, todo arrumadinho, cheiroso. Apartamento de velhos, com passado bonito. Uma penumbra delicada. Colcha bonita na cama em que dormi, vaso de flor na sala, cortina de cor sóbria, toalha branca de rendinha na hora do café da manha. Acordei quatro dias com o perfume do café da manhã de Recife. Cuscus doce, leite quente, queijo, manteiga saborosa... inesquecível. O Sr. Lins , é claro, gostava de conversar... contou como foi, na infância, esperar a passagem da Coluna Prestes na cidade em que ele vivia. O clima de aventura que o fato trouxe para a vida dele. Quis seguir a Coluna, o pai não deixou. Contou de uma cheia que ilhou o casal durante dias no apartamento, porque a água subiu até o 3º andar. Quase não deixava a mulher contar suas próprias histórias. Será que é por isso, que só lembro o nome dele? Que pena. Também não lembro o nome da filha, a morá. Mas, lembro dela, chegando na hora do almoço, contando algumas passagens do dia na escola. Não havia nem uma sombra de cansaço ou de desilusão! E então fui atrás da Recife do poeta! Rua do Sol, rio Capibaribe, as pontes, a festa da pitomba - delícia de fruta. Andei muito pelas ruas da cidade. O prédio da Confeitaria Glória, onde foi assassinado João Pessoa me deixou impressionada. Andei por algumas praias. Que lindo aquele Recife, sem preocupação! Conheci a fantástica árvore de Fruta-pão, pois havia uma bem em frente ao apartamento.Antes, aquela árvore era só uma imagem na figurinha em um álbum que meu irmão colecionava. Guardei a lembrança da senhora espantada, dizendo que "agora as mulheres andam de sacolas nas mãos, é mais pratico", como se fosse uma grande mudança de comportamento. Senhoras educadas não carregavam sacolas! E fiquei conhecendo o significado da palavra "inverno", chuva da tarde! Eu, a paulista que sabia, naqueles anos, o que era um inverno de verdade. Conheci Recife? Um pouco, um sonho de Recife. Algumas pessoas bem especiais. Elas fizeram meu Recife. Depois, tomei um ônibus e fui até Maceió. Pela praia, vendo aquelas casinhas e coqueiros inacreditáveis...sem máquina digital para registar tudo, só a memória. Uns meses depois, recebi pelas mãos do meu pai um bilhetinho do Sr. Lins, agradecendo a "filha tão educadinha que o sr. me pediu para hospedar", carinhoso. Sinto saudades de pessoas carinhosas. Imagino o casal agora " dormindo profundamente" como diria o poeta.
Maceió? Outro dia, falo dela!
Que coisa linda! O mais bonito de tudo: o seu texto é você, morá. Todas nós somos morot (o plural de morá). Beijos!
ResponderExcluirMorá, Andréa! Fase boa da vida... não é? Recordando, compartilhando. Adoro. Beijos!
ResponderExcluirRecife ficou ainda mais bonita agora, com seu descrever!Os detalhes, aromas,cores,a delicadeza dos gestos hospitaleiros,além da bela paisagem física... vc consegue trazer saudade ,num cantinho aqui!Bj
ResponderExcluirObrigada, morá Ana! Nunca escrevo para mim... necessito do outro, de vocês! Bj.!
ResponderExcluir(...)Sinto saudades de pessoas carinhosas. Eu também! Ainda bem que podemos sentir essas pessoas carinhosas mesmo à distância!Muito sensível o texto... caramba Elaine!
ResponderExcluirLili...obrigada!
ExcluirVocê me trouxe à memoria pessoas que cruzaram o caminho da Cidinha e meu quando viajamos de mochila. Os chilenos, em Matozinho - MG, que nos trataram como se fossemos da família; as meninas que conhecemos em João Pessoa e nos levaram para passar o dia das mães em Sergipe...um café da manhã maravilhoso, com tapioca e aipim dos deuses. è, também não fotografamos, mas a memória registrou.
ResponderExcluirBjs.
Paula
Que experiências... não é?
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