Minha mãe trazia para casa,
depois de um dia de trabalho como diarista, além do cansaço, um montão de
revistas. Realidade, Manchete, Fatos & Fotos, exemplares da Seleções...
revistas lidas pelos patrões. E eu lia todas!
Lembro perfeitamente de alguns
textos e matérias que me marcaram por motivos diferentes. Uma crônica da Seleções
escrita por uma dona de casa me divertiu muito e ainda hoje me lembro dela,
quando estou com a casa desarrumada e toca o interfone! Pânico! A crônica tinha
o nome sugestivo de “Aprenda a conviver com a sua casca de laranja” Assim
mesmo! Adorei o título -precedido de uma ilustração em que uma mulher parecia uma malabarista, com as traquitanas da cozinha penduradas nas mãos, equilibrando um milhão de coisas ao mesmo tempo - e a escritora falava em como era difícil manter tudo em
ordem, casa, filhos – aquele modelo americano de organização – e como uma vez,
recebeu a visita de uma vizinha e não percebeu que havia uma casca de laranja
jogada no chão da cozinha. Quando se deu conta, a pobre suava, tentando esconder a tal casca para
que a vizinha não percebesse ou não a julgasse uma preguiçosa. Não teve jeito e,
chorando, ela tentava se desculpar... e então, pirlimpimpim,... a vizinha
resolveu confessar que ela também tinha problemas e baratas embaixo da pia na
cozinha linda e perfeita. Porque me lembro tão bem? Eu nunca quis ser dona de
casa... mas adoraria ter escrito uma crônica que pudesse imprimir uma lembrança
tão forte como essa imprimiu em mim. Era divertida a maneira como ela ia
descrevendo a tentativa inútil de esconder seus defeitos e o alívio de
compartilhar com a vizinha as mesmas preocupações bobas. E ainda havia crianças
chorando e brinquedos pela casa... um clima criado pela escritora, difícil de esquecer.
Um conto da revista Manchete me
deixou muito impressionada... acho que era uma tradução. Nem imagino o autor,
mas havia uma descrição de um dia muito quente – os adjetivos me fizeram sentir
o mesmo calor – e a descrição final da personagem abrindo a mangueira no jardim
e regando tudo com aquela água fresca batendo nas coisas e no próprio corpo...
como me impressionaram. Acabei de pensar que havia um quê metafórico sensual
que naquele momento eu não percebia, mas agora...
E a Realidade?... ler
aquela revista era quase um ato de transgressão. Lembro do famoso número em que o repórter narrava e fotografava
um parto no meio do nada... guardei o exemplar para poder rever quando
quisesse, como se fosse um troféu. Essa e outras reportagens históricas me fizeram sonhar e viajar muito... leituras impressionantes que a revista me deu.
As fotonovelas eram especialmente
boas de ler... aqueles galãs italianos, de cabelo arrumadinho, que sofriam
ciúme, traição, desencontros, injustiças... delícia! Ouvindo a trilha sonora perfeita, Gianne Morandi, eu também era uma mocinha da revista.
As fotos incríveis da
Fatos&Fotos... um editorial de moda da Rhodia, fotografado em Barcelona...
a primeira vez que ouvi falar de Gaudí! As cores e formas... impossível esquecer. E o editorial de decoração? Banheiros
incríveis... desejo puro de beleza! Ah! ah! ah! O banheiro da nossa casa era do lado de fora, um quarto grande, com o vaso e uma pia feia, o chuveiro... qualquer dia eu conto do chuveiro. Essas eu também guardei durante muito
tempo. Claro que as fotos de carnaval, bailes e desfiles fizeram minha
imaginação viajar muito! Clóvis Bornay e aquele sorriso debaixo do pancake,
olhos bem delineados, o verde das plumas e a descrição de tudo isso em uma
matéria bem escrita. Ah, sim, as matérias eram bem escritas!
Nem sei se já falei disso tudo
antes... sei que, às vezes, me pego lembrando dessas passagens e gosto de saber
que minha leitura teve tantas influências diferentes... gosto mesmo!
Eu era uma menina de, mais ou
menos, 10 anos, morava na Corondá, 35, Vila Marieta, Subdistrito da Penha...adorava a palavra "subsdistrito" parecia importante,
assim mesmo, na placa da rua!
Vocês pensam nisso?